quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Notinhas sobre política

1. Reforma política: É mais do que urgente que os partidos de esquerda e progressistas, em conjunto com os movimentos sociais, se mobilizem para aprovar, ainda neste ano, uma reforma político-eleitoral capaz de aprofundar nossa democracia. Voto em lista fechada, financiamento público de campanha, fidelidade partidária, fim das coligações para cargos proporcionais (deputados, senadores, vereadores), ampliação do uso de mecanismos de participação direta, como referendos e plebiscitos, dentre outros, são pontos que devem necessariamente estar presentes nessa reforma. Gostei da posição dos senadores petistas que integrarão a Comissão do Senado instalada para discutir especificamente o tema. No entanto, como não se deve esperar muita coisa de uma Comissão capitaneada por José Sarney, e cujos integrantes, em grande medida, são beneficiados pelo atual modelo político brasileiro, será preciso uma grande movimento da sociedade civil organizada para que essa reforma, a mais importante para o nosso país, seja de fato implementada. Espero poder escrever, em breve, algo mais detalhado a respeito.

2. Salário mínimo: Na minha opinião, há duas coisas a se consderar. Primeiramente (e mais importante), é destacar que, sem dúvida, foi uma grande vitória para os trabalhadores a aprovação da política de valorização permanente do mínimo até 2015, baseado os aumentos anuais na regra inflação + crescimento do PIB de dois anos antes. Sinto, de fato, no governo Dilma, a disposição de elevar o poder de compra do salário mínimo paulatinamente, até que ele atinja níveis satisfatórios. No entanto, ainda compartilho a posição defendida pela CUT, que dado o caráter excepcional do momento (o PIB de 2009 foi negativo por conta da crise mundial) poder-se-ia ter aprovado, sem maiores abalos para as contas públicas, um salário um pouco maior já para este ano. Tratar, agora, os trabalhadores, com a mesma excepcionalidade com que os empresários forma tratados no auge da crise. Não obstante, essa divergência não muda em nada minha opinião, que repito: foi uma grande vitória para a classe trabalhadora brasileira a aprovação de uma política de Estado (e não apenas de um governo) para valorizar crescentemente o salário mínimo. Espero que, dentro em breve, como sinaliza o governo, a correção da tabela do Imposto de Renda e uma política semelhante para valorização das aposentadorias, também sejam aprovadas.

3. Democratização dos meios de comunicação: Ainda no ano passado, escrevi um texto sobre esse tema, que dentro em breve espero postar aqui no blog. Junto com a reforma política, é outro tema que deve entrar imediatamente na pauta de toda a esquerda brasileira. O governo está disposto, mas, assim como no caso da reforma político-eleitoral, é indispensável um grande movimento de massas para fazer o tema avançar, pois aqui, como lá, os interesses a serem confrontados são gigantescos. Mas é possível. Aliás, é necessário!


terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O corpo próprio em Merleau-Ponty

O corpo próprio é o pilar da filosofia de Merleau-Ponty. Seja na sua Fenomenologia da percepção ou em sua última ontologia, esboçada em O visível e o invisível, o corpo é quem abre o caminho, na filosofia merleau-pontyana, de se superar os impasses ocasionados pelas filosofias da consciência (isto é, aquelas filosofias que estabelecem a consciência ou a subjetividade como ponto de partida).

O primeiro ponto a destacar é que o corpo de que falamos, nosso corpo, não é aquele de que fala as ciências positivas. De fato, nosso corpo próprio, tal como o vivenciamos, não é uma coisa, um objeto de estudos das ciências positivas, não é um feixe de ossos, músculos e sangue, não é uma rede de causas e efeitos, não é o suporte para uma alma ou para uma consciência. Todas essas características, diz Merleau-Ponty, são projeções que fazemos a posteriori em relação ao corpo. Quer dizer, não o vivenciamos desse modo, não nos comportamos assim em relação a ele. Nosso corpo próprio, para-nós, é a forma de nossa imersão no mundo, o modo fundamental de sermos e estarmos no mundo, de nos relacionarmos com ele e ele conosco. Nosso contato primeiro com o mundo é sensível, e isso só é possível porque somos um corpo, porque compartilhamos, com ele, de uma mesma carne.
Henri Matisse, Nu azul.

Nosso corpo tem uma característica especial. Quando, por exemplo, seguro minha mão esquerda com minha mão direita, percebo que há em meu corpo certa reflexão; a mão que toca e a mão tocada podem se alternar em seus papéis. Há reversibilidade. Meu corpo, portanto, é táctil e tocante. O mesmo ocorre com os demais sentidos. Meu corpo é um ser visível, em meio a uma infinidade de outros seres visíveis, mas com essa peculiaridade: ele também é vidente. Vejo, mas também posso ser visto. Inclusive, sou visível para mim. Meu corpo é sonoro, mas também pode se fazer ouvir e pode ouvir-se quando emite sons. Ouço quando falo e ouço quem me fala. Sou sonoro para mim mesmo e para outrem.

Por isso, quando percebemos um corpo, um gesto, uma expressão, uma fisionomia, podemos nos reconhecer neles, reconhecer que ali há um outro, cujo corpo é semelhante ao meu e que, portanto, me é compreensível e comunicável, tal como sou para ele.

Há ainda uma outra característica de nosso corpo próprio: a possibilidade que ele tem de se “dilatar”, expandir seus limites de percepção e atuação para além do estabelecido por nossa anatomia. Vejamos esse exemplo de Merleau-Ponty na Fenomenologia da percepção: “Uma mulher mantém sem cálculo um intervalo de segurança entre a pluma de seu chapéu e os objetos que poderiam estragá-la, ela sente onde está a pluma, assim como nós sentimos onde está nossa mão. Se tenho o hábito de dirigir um carro, eu o coloco em uma rua e vejo que "posso passar" sem comparar a largura da rua com a dos pára-choques, assim como transponho uma porta sem comparar a largura da porta com a de meu corpo”. Nesse sentido, prossegue o filósofo, habituar-se a usar um chapéu, ou um carro, “é instalar-se neles ou, inversamente, fazê-los participar do caráter volumoso de nosso corpo próprio. O hábito exprime o poder que temos de dilatar nosso ser no mundo ou de mudar de existência anexando a nós novos instrumentos”.

Em suma, é pelo corpo, pelos sentidos, que temos nosso contanto originário com o mundo, que podemos nos sentir parte dele, e nos comunicarmos tanto com ele quanto com os outros seres. A intersubjetividade, portanto, é sustentada por uma intercorporeidade fundamental, por um verdadeiro “diálogo” inter-corpos (se pensamos em relação à sexualidade, por exemplo, pode ficar mais fácil de entender como nossos corpos, durante os momentos de sedução, desejo e do próprio ato sexual, parecem comunicar-se entre si, sem intervenção de uma “consciência”). É pelo corpo, enfim, que em seus últimos escritos – dos quais destacamos Signos e O visível e o invisível – que Merleau-Ponty visa superar a antiga clivagem sujeito-objeto, consciência-mundo, buscando nesse contato primitivo, anterior a toda tematização, a toda idealização, uma nova proposta de ontologia, que não foi concluída por conta de sua morte prematura: uma ontologia do sensível.

Para quem se interessar:

MERLEAU-PONTY. Fenomenologia da percepção (Ed.Martins Fontes), sobretudo a Primeira Parte.

________________. O visível e o invisível (Ed. Perspectiva).

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Sobre o salário mínimo

O primeiro grande desafio do governo Dilma, a meu ver, é a definição do novo valor do salário mínimo. Desde 2009, um acordo entre centrais sindicais e governo, aprovado pelo Congresso Nacional, previa que o reajuste anual se daria com base na inflação do ano anterior somado ao aumento do PIB de dois anos antes. Ocorre que, em 2009, não houve crescimento do PIB. Logo, o valor do mínimo deste ano apenas reporia a inflação de 2010, sem nenhum aumento real: o valor do novo salário passaria a R$ 545,00, que é a proposta do governo. Contra ela, as centrais exigem um ganho real no poder de compra, e propõem um mínimo para esse ano de R$ 580,00.

O governo, a princípio, não está aceitando negociar um valor mais alto, pois seu objetivo é garantir, neste primeiro ano, um efetivo equilíbrio fiscal (relação entre gastos e receitas do governo). Para isso, uma das primeiras medidas adotadas foi a nova elevação da taxa de juros do país (a taxa Selic), além de medidas, como a não elevação do salário além da reposição da inflação, com o intuito de segurar a demanda e reduzir o consumo, evitando, assim, o aumento da inflação. Ocorre que o aumento dos juros valoriza o real (numa palavra, os especuladores ganham mais, pois o “preço” de venda da nossa moeda aumenta) e aumenta o serviço da dívida interna (aqueles que tem títulos e papeis do governo receberão juros maiores) o que anula o equilíbrio fiscal (o que o governo economiza cortando gastos/investimentos acaba indo par ao pagamento da dívida interna). Nesse caso, o aumento dos juros serviriam apenas para tentar também controlar a inflação que, embora um pouco elevada, ainda está dentro dos parâmetros estabelecidos como razoáveis.

O ponto a se destacar é que um aumento do mínimo que cobrisse apenas as perdas ocasionadas pela inflação significaria, no fundo, uma ruptura com uma política econômica de valorização real do salário mínimo que deu muito certo nos últimos anos, pois elevou o poder de compra do trabalhador, fomentou o mercado interno e nos permitiu passar quase incólumes pela crise que ainda atinge grande parte da Europa e os Estados Unidos. Nesse sentido, as palavras a seguir, que transcrevo de um artigo do consultor sindical João Guilherme Vargas Netto, publicado na semana passada no portal “Vermelho” (link para o artigo completo aqui) são precisas:

“Insistir na política de fortes aumentos do salário mínimo é investir na orientação estratégica que nos garantiu o crescimento dos últimos anos e nos fez vencer a crise externa. Sem bravatas e sem ilusões e sem subestimar o peso dos adversários (que não são donas de casa preocupadas com o salário de suas empregadas domésticas) devemos continuar nossa luta que precisa, superado esse embate, concentrar-se fortemente em combater a tendência da trindade econômica de aumentar os juros, restringir o crédito e enxugar os gastos públicos”.

Espero que o governo, ilustrado no que João Guilherme denominou “trindade econômica” (Antônio Palocci, Guido Mantega e Alexandre Tombini), além, claro, da presidenta Dilma, tenham sensibilidade para rever sua posição inicial e, diante deste momento de exceção, não se deixarem levar pela “ortodoxia econômica”, garantindo um aumento no mínimo para além da inflação (mesmo que fique um pouco abaixo dos R$ 580,00 pedido pelas centrais sindicais), pois frear agora a política de valorização do salário mínimo implementada durante o governo Lula pode gerar, num futuro próximo, consequências bastante negativas para o desenvolvimento do país, sobretudo para os trabalhadores.


terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Aquele beijo

O beijo, de Auguste Rodin
Deixo vocês com outro conto que escrevi recentemente, intitulado "Aquele beijo", um conto que trata do problema da violência contra as mulheres, ao mesmo tempo em que fala de um amor em vias de se realizar.

Aproveitando a oportunidade, gostaria de agradecer quem fez o download do meu outro conto, "Memória" (veja o post aqui).

Abraços a todas e todos!

Download do conto Aquele beijo: aqui