"Passado mais de um mês
desde as imprevistas manifestações que sacudiram o Brasil no mês de junho,
parece haver certo consenso, ao menos à esquerda, de que, independentemente das
diferentes avaliações de suas causas e consequências mais imediatas, elas tiveram
ao menos o mérito de expor, a exemplo do que já ocorrera recentemente em outros
países, a falência de nosso atual sistema político. Com efeito, já não se pode
negar que a estreiteza de nossa democracia não é mais capaz de dar vazão ao
legítimo anseio de participação que floresceu, sobretudo, com o advento e a
disseminação da internet e de suas redes sociais. Tampouco é capaz de permitir
respostas satisfatórias às demandas surgidas a partir das transformações
econômicas e sociais vividas pelo Brasil nos últimos dez anos.
Nesse sentido, não resta dúvida
de que apenas uma profunda reforma em nosso sistema político-eleitoral, nas
formas de representação e nos mecanismos de participação popular, pode abrir
uma saída positiva para este novo momento. No entanto, como ficou provado pelos
ataques ferozes da direita e dos setores dominantes às propostas da presidenta
Dilma – primeiro, de uma Constituinte exclusiva sobre o tema e, na sequência,
de um plebiscito –, a resistência à mudança da ordem política é muito mais
resoluta do que pode parecer. E isso não apenas por conta do desejo de grande
parte de nossos atuais representantes de continuar a se locupletar de um
sistema que favorece a corrupção e a conservação do poder, mas também, e
sobretudo, porque o modelo político vigente, no Brasil, está intimamente ligado
às necessidades de reprodução de nosso capitalismo historicamente
predatório".
Esta é a introdução de um artigo
que escrevi recentemente, após a onda de protestos de junho, intitulado "Entraves econômicos à reforma política", e que acaba de ser
publicado na edição 114 da revista Teoria e Debate. Nele, busco pontuar
a profunda relação entre nosso sistema político (hoje definitivamente
posto em xeque) e as necessidades de reprodução do capital no contexto
brasileiro. A meu ver, o sucesso do "lulismo" fez nascer, desde
seu bojo, uma nova espiral de demandas e aspirações (em particular, por
serviços públicos de melhor qualidade) que se confrontam crescentemente com a
lógica perversa da acumulação capitalista brasileira – a qual, dentre outras
coisas, se nutre fortemente da deficiência crônica dos serviços oferecidos pelo
Estado. Por isso, desvendar as relações entre a forma que o capitalismo assumiu
historicamente no Brasil e o nosso atual sistema político - que com seus
estreitos limites de "governabilidade", bloqueia qualquer tentativa
de se operar mudanças estruturais mais profundas e no ritmo adequado - ajuda a
tecer o pano de fundo que se encontra por trás da resistência oferecida,
pela elite e seus representantes, às propostas de reforma política postas na mesa
pela presidenta Dilma e pelo PT. É que tais propostas, centradas na
participação popular, abrem uma ameaça potencial à continuidade daquela forma
de relação entre economia e política. Dito de outro modo, põem em risco o poder
da minoria economicamente dominante.
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