Neste 28 de setembro de 2016, completam-se 50 anos do falecimento de um dos maiores artistas do último século: o pai do surrealismo, o francês André Breton.
Conheci Breton na época de faculdade. Quer dizer, já tinha ouvido falar do surrealismo, nas aulas de literatura do colegial sobre as vanguardas artísticas modernas, mas foi mais tarde que o movimento realmente chamou minha atenção. “Acredito na resolução futura destes dois estados, tão contraditórios na aparência, o sonho e a realidade, numa espécie de realidade absoluta, de surrealidade, se assim se pode dizer”. Era a plena exaltação da liberdade, da imaginação, da criatividade, do sonho – mas, sem deixar de lado o real. Conjugação difícil, sem dúvida, mas não impossível, como Breton demonstrava.
Com efeito, a leitura dos Manifestos do surrealismo foi marcante, dentre outras coisas, porque representava, naquele momento, a tradução do que procurava para minha vida: a conjunção entre a rebelião romântica expressa no imperativo de “mudar a vida”, de Rimbaud, com o “transformar o mundo”, orientado por uma perspectiva não dogmática, de Marx – ambos, entrelaçados pela psicanálise freudiana. “Do ponto de vista intelectual”, explicava em 1930, “tratava-se, trata-se ainda, de por à prova por todos os meios e de fazer reconhecer a qualquer preço o caráter factício das velhas antinomias destinadas hipocritamente a prevenir toda agitação insólita por parte do homem, nem que fosse por lhe dar uma ideia minguada de seus meios, ou por desafiá-lo a escapar em dimensão válida à coerção universal”.
Depois dos referidos Manifestos, vieram Vasos comunicantes, os poemas, o romance Nadja, o Manifesto por uma arte revolucionária e independente (escrito com Diego Rivera e Léon Trotsky) e a abertura para outras expressões artísticas surrealistas: o cinema fantástico de Luis Buñuel e Federico Fellini, a pintura de Magritte, Juan Miró e daquele que considero o maior pintor do século XX, Salvador Dalí (cuja obra, em grande parte, tive o enorme prazer de apreciar em uma exposição em Paris, em 2013, num dos momentos mais sublimes de minha estadia por lá).
Nesses tempos obscuros que vivemos – poderia dizer: surreais, no sentido mais pejorativo que por vezes se aplica ao termo –, que a arte de Breton possa servir de alento ao espírito e combustível para não deixar morrer os nossos sonhos mais altos de liberdade: “No meu modo de entender nada existe de inadmissível. O irreal é tão verdadeiro como o real. O sonho e a realidade são vasos comunicantes”.