
Não que o rigoroso sistema de pensamento hegeliano seja
inconteste. Longe disso. Mas, dificilmente, uma análise da realidade
contemporânea pode prescindir de sua contribuição. Mesmo que seja para negá-lo.
Como Marx, que a partir de Hegel, chegaria à conclusão de que a tarefa da
Filosofia pós-hegeliana não poderia ser mais a de “interpretar” a realidade social contemporânea,
mas de “realizar” a Filosofia. Para isso, porém, já não bastaria a especulação
filosófica – que o idealismo hegeliano, com sua reflexão sobre a sociedade burguesa alemã desde o ponto de vista dessa classe, teria esgotado. Era preciso “transformar
o mundo”. Não por acaso, a crítica filosófica (a Hegel enquanto porta-voz da realidade alemã e de suas contradições intestinais) torna-se, em Marx,
crítica à própria Filosofia, e esta se converte, finalmente, em teoria social. Teoria devidamente assentada na lógica dialética hegeliana, conquanto visando superar aquele idealismo e sua perspectiva burguesa.
Uma das obras mais importantes de Hegel – especialmente
pelos desdobramentos que ela suscitaria, como a crítica marxiana acima mencionada – são seus Princípios da Filosofia do Direito.

Segundo Hegel, o direito positivo moderno fundamenta sua
vitalidade e aplicabilidade tanto na propriedade privada quanto no contrato. Trata-se
do direito strictu sensu,
direito abstrato, que versa embrionariamente sobre a ideia e concepção de
liberdade, expressa através do imperativo do direito: “sê uma pessoa e respeita
os outros como pessoas”. Neste domínio, típico do espírito subjetivo, Hegel elucida o movimento lógico do
direito, apreendido substancialmente enquanto ideia ética.
Não obstante, a determinação lógica do conceito de direito
só se efetiva plenamente no Estado. Isso significa que ele se materializa a
partir do Estado. A materialidade que o Estado confere ao direito faz com que
apareça a segunda concepção de direito. Trata-se do direito compreendido como
algo mais abrangente. Nessa concepção ampla se encontra a ideia de reino da
liberdade efetiva.
A Filosofia do Direito de Hegel, apreendida
enquanto espírito objetivo, visa apresentar as condições de efetivação
da essência do espírito, que é determinar-se como liberdade. O lugar designado
para essa tarefa, tanto social quanto institucionalmente, é a Sociedade Civil. A sociedade civil hegeliana se define como um sistema de carecimentos, uma estrutura de dependências recíprocas na qual os indivíduos buscam satisfazer suas necessidades através do trabalho, da divisão do trabalho e da troca. Além disso, neste domínio, asseguram a defesa de suas liberdades, propriedades e interesses mediante a administração da justiça e das corporações. Em suma, para Hegel, a sociedade civil é o domínio dos interesses privados, econômicos e antagônicos entre si.
Por isso, somente no Estado – apreendido conceitualmente enquanto comunidade ético-política, eticidade – é que a determinação plena da liberdade humana se coloca de fato. Com efeito, fiel ao conceito de história como um movimento de negatividade e reconciliação, ou seja, como dialética, Hegel distingue a eticidade em três esferas: a família, a sociedade civil e o Estado. Este último aparece como síntese dialética entre particularidade e universalidade, na procura da totalidade. De acordo com Hegel, o Estado assume esta tarefa por conseguir articular em uma perspectiva de totalidade, tanto a vontade particular quanto a vontade substancial universal, e, o mais importante – pelo menos para as múltiplas formas determinativas da sociabilidade burguesa – sem anular o princípio da liberdade subjetiva. O homem, aqui, emerge enquanto um universal abstrato, desprovido de toda e qualquer particularidade e individualidade que o identifique. Trata-se de uma determinação imediata da pessoa, que só pode se exteriorizar pela propriedade privada, ou seja, estabelece-se a relação da vontade livre da pessoa do ser universalmente abstrato com a coisa externa.
Por isso, somente no Estado – apreendido conceitualmente enquanto comunidade ético-política, eticidade – é que a determinação plena da liberdade humana se coloca de fato. Com efeito, fiel ao conceito de história como um movimento de negatividade e reconciliação, ou seja, como dialética, Hegel distingue a eticidade em três esferas: a família, a sociedade civil e o Estado. Este último aparece como síntese dialética entre particularidade e universalidade, na procura da totalidade. De acordo com Hegel, o Estado assume esta tarefa por conseguir articular em uma perspectiva de totalidade, tanto a vontade particular quanto a vontade substancial universal, e, o mais importante – pelo menos para as múltiplas formas determinativas da sociabilidade burguesa – sem anular o princípio da liberdade subjetiva. O homem, aqui, emerge enquanto um universal abstrato, desprovido de toda e qualquer particularidade e individualidade que o identifique. Trata-se de uma determinação imediata da pessoa, que só pode se exteriorizar pela propriedade privada, ou seja, estabelece-se a relação da vontade livre da pessoa do ser universalmente abstrato com a coisa externa.
Hegel pensa o Estado soberano como modo de organização
necessário à existência da vida social. A rigor, não há liberdade fora do
Estado, porque não há povo se desprovido de Constituição. Antes da organização
estatal, há tão somente uma multiplicidade inorgânica de indivíduos. A
instituição da Constituição, do Direito, representa e realiza a unidade (conceitualmente). Assim, enquanto realidade que extrapola o cenário individual, o Estado
constitui o limite externo e formal para a liberdade do indivíduo, mas assume,
ao mesmo tempo, a própria realização do seu direito à liberdade.
Enfim, no sistema hegeliano, a ética se encontra
intimamente ligada à História e se realiza na comunidade política. São as
relações sociais que determinam a vida moral do indivíduo. Hegel distingue
entre uma moralidade subjetiva, individual, ligada à vontade, e uma moralidade
objetiva, universal, domínio do Direito. O Estado hegeliano deve mediar os
interesses públicos e privados, da sociedade civil e da sociedade política, garantindo a realização da vida ética,
na qual os interesses daqueles dois domínios (cindidos) são reconciliados. O
sujeito moral, pela mediação da família e da atividade profissional que exerce,
reconhece que a sua existência depende do Estado. A vida ética é a
reconciliação entre estes domínios, o que só é possível no Estado, realização
da história da Razão universal, do Saber Absoluto, Estado de Direito.
Referência bibliográfica:
HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da Filosofia do Direito.
Trad. Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
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