Não é surpresa para ninguém que a
sanha golpista, que parecia ter arrefecido nos últimos meses, voltou com tudo
após a iminência da rejeição das contas de campanha da presidenta Dilma por parte
do TCU (Tribunal de Contas da União), bem como das novas denúncias, em particular
aquelas de Ricardo Pessoa, da UTC, na operação Lava-Jato. Por exemplo, o congresso do PSDB
realizado neste último domingo, que reconduziu Aécio Neves à
presidência do partido, deixou claro o que planeja a oposição para o segundo
semestre: abreviar o quanto antes o mandato de Dilma e, a partir daí, ou compor
um novo governo encabeçado por Michel Temer, ou convocar novas eleições. E, é evidente que essa movimentação
só é possível por conta da inédita fraqueza política do atual governo (no Congresso
e fora dele), cujos índices de aprovação despencam a cada nova pesquisa.
Não vou entrar no mérito aqui do
bombardeio midiático que, há tempos, criou um cenário propício para essa perda
de popularidade de uma presidenta reeleita há menos de um ano. Isso, agora, tem
menor importância. O que interessa, neste momento, é o fato concreto: de um
lado, um governo fragilizado, desacreditado, alvo permanente de denúncias de
corrupção, e que enfrenta, ainda por cima, um desgaste natural devido ao mau
momento da economia; de outro, uma oposição que, atuando em mais de uma
trincheira (PSDB, Eduardo Cunha, mídia) vê-se apta a conseguir aquilo que as
urnas lhe rejeitaram inapelavelmente por quatro vezes nos últimos doze anos:
retomar sem intermediários o pleno controle do país.
Neste cenário, o que resta a
Dilma, ao governo e ao PT? É aqui que o exemplo grego pode ser bastante
útil. Em janeiro, quando o Syriza,
partido de esquerda liderado por Alexis Tsipras, venceu as eleições, escrevi aqui que aquele triunfo representava um “sopro de esperança” não apenas para os
gregos ou para os europeus, mas, inclusive, para além das fronteiras do velho
continente. Ontem, de fato, os gregos mostraram haver outro caminho possível para além
do consenso neoliberal. Mas, importa destacar, a histórica vitória do “não” no
referendo deste domingo, que representou uma reação popular inédita aos ditames
do mercado financeiro internacional, só foi possível pela coragem do governo de
Tsipras, que, conforme prometido em sua campanha eleitoral, não se curvou às
chantagens do capital especulativo, apoiando-se democraticamente na força do
seu povo.
É essa coragem que deve servir de
exemplo a Dilma, a seu governo e a seu partido neste momento. Se há uma
possibilidade de a sanha golpista da oposição não prosperar, ela passa justamente
pelo uso da força da base social que reelegeu a presidenta petista. Dito de
modo claro: só se pode evitar o golpe que está sendo desenhado nas ruas, e não
nas negociações de cúpula (que se dão com os maiores interessados em que o golpe seja
exitoso).
Contudo, aquela base que poderia
sair às ruas para defender o mandato da presidenta encontra-se dispersa e
desanimada, não apenas porque acuada diante do cerco midiático, mas, sobretudo,
porque não encontra apoio nas ações do governo para realizar um contraponto a
este cerco. Com efeito, fica difícil pedir aos trabalhadores organizados que
saiam às ruas para defender um governo que, em nome da austeridade (contra a
qual combateu corretamente durante a campanha) editou duas MPs que – sem tergiversações
– representam ataques desnecessários a direitos trabalhistas consagrados. Ou pedir
empenho para os sem-terra, depois de colocar a inimiga número 1 do MST, Kátia
Abreu, no Ministério da Agricultura (e com direito a efusivos elogios). Na
mesma linha, há de se questionar como cobrar dos reitores e estudantes das
instituições federais de ensino o mesmo apoio dispensado nas eleições de 2014,
quando essas instituições sofrem dia a dia com a falta de recursos oriunda da
política de corte de gastos do ministro da Fazenda? Ou querer que os estudantes
de baixa renda defendam um governo que, na mesma linha, contingencia verbas destinadas
ao crédito estudantil?
Ora, antes que me acusem de “anti-petismo”,
de “fazer o jogo da direita”, ou algo do gênero, me parece desnecessário
lembrar que entendo haver muitos pontos positivos nos governos petistas, inclusive no que
diz respeito aos direitos trabalhistas, à reforma agrária e à educação. Meus textos
aí estão para mostrar o que penso a respeito. E é claro que, independente de
qualquer avaliação sobre o atual governo, é preciso, acima de tudo, preservar
nossa já cambaleante democracia – hoje ameaçada pela onda de proto-fascismo
que atravessa nossa sociedade, como escrevi em posts anteriores.
Contudo, me parece claro que
apenas se prender ao passado, ou à legalidade, infelizmente pode não bastar. Dilma, o governo e o
PT precisam urgentemente reaglutinar sua base para evitar o desfecho golpista. Mas,
para isso, é indispensável reanimar essa mesma base, oferecer alternativas
reais (e não só retóricas) ao pessimismo que a cerca. Nesse sentido, só há um caminho: reorientar para ontem a política econômica vigente.
Do contrário, temo que assistiremos passivamente (ou quase) a derrocada do governo
petista (e, por consequência, do próprio partido e da esquerda em geral). Por isso, que me perdoem o
clichê, mas, neste momento, há de se mirar no exemplo das mulheres e dos homens
de Atenas, e enfrentar sem medo os interesses que devem ser enfrentados.
Honestamente, no entanto, não sei
se ainda há tempo para essa reaglutinação, mesmo com uma virada na política
econômica, dado o momento delicadíssimo que atravessamos. Mas, é preciso
tentar. Até porque, a história costuma ser implacável com aqueles que desistem
antes mesmo de lutar.
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