quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O primeiro debate e o início da desconstrução de Marina

Na noite desta terça-feira, 26/08, foi realizado o primeiro debate entre os candidatos e candidatas à presidência da República. Em que pese o péssimo horário de início (22h) e sua longa extensão (foi até 1h), entendo ter sido um dos melhores dos últimos tempos, com uma participação geral bastante razoável e, sobretudo, com potencial de importantes consequências para a disputa eleitoral.

Em geral, um debate serve, primeiramente, para demarcar campos políticos. Com este não foi diferente. Entre os candidatos “nanicos”, a surpresa positiva ficou por conta de Eduardo Jorge, que debatendo temas como aborto, legalização das drogas e reforma política, posicionou o PV na órbita da esquerda como há muito o partido não se posicionava. Luciana Genro manteve o discurso do PSol e, não fosse a chatice do ressentimento com o PT (típico da maioria dos ex-petistas, diga-se), poderia ter tido uma atuação melhor. Tem boas propostas, também tocou em temas importantes, como a laicidade e a questão indígena (esta, um dos pontos fracos do atual governo), mas a meu ver, não dialogou verdadeiramente com sua base em potencial, os trabalhadores. À direita, Pastor Everaldo martelou sua proposta de privatizar tudo, menos as preferências e orientações sexuais alheias. E Levy Fidelix, o mais fraco dos sete presentes, foi um peso morto.

No que se refere aos principais concorrentes, a primeira expectativa era saber como se comportariam após a divulgação da pesquisa do Ibope, poucas horas antes, que mostrava um crescimento de Marina na segunda posição e queda especialmente de Aécio, pela primeira vez em terceiro e distante da candidata do PSB.

Curiosamente, o tucano, que teve boa postura ao longo do debate, não atacou sua agora rival direta e preferiu concentrar-se em Dilma. Na minha opinião, perdeu todos os embates com a presidenta. Além disso, bateu na tecla de que teria feito uma “ótima gestão” (sic) em Minas Gerais e apresentou, como “novidade”, Armínio Fraga como seu nome para o ministério da Fazenda. Obviamente, não convenceu. Na verdade, embora fale bem, Aécio é tão vazio de conteúdo que, a continuar assim, arrisca-se a perder ainda mais espaço na corrida presidencial.

Dilma teve um desempenho muito melhor do que nos debates de 2010. Conquanto tenha sido alvo preferencial de todos os demais candidatos, em nenhum momento saiu-se derrotada nos confrontos diretos. Pelo contrário. Exceção feita ao primeiro bloco, onde teve uma fala com bom conteúdo, mas se mostrou um pouco nervosa, a presidenta apresentou números e teve respostas firmes (como na defesa do “Mais médicos” e da Petrobrás) e propostas sólidas. Reforçou politicamente seu lado – o que é o mais importante –, sobretudo ao defender o plebiscito para a reforma política, a regulação econômica da mídia e uma democracia com participação popular.

Mas, inegavelmente, a maior expectativa da noite era o desempenho de Marina, que pela primeira vez seria confrontada ao contraditório. Ora, neste sentido, e ainda que a postura da candidata tenha sido muito boa (falando de forma contundente, sem nervosismo), o debate serviu fundamentalmente para começar a desmascarar sua “nova política”: um projeto contraditório, sem propostas claras, personalista, conservador e neoliberal, (muito mal) travestido de “novidade”. Um projeto que nega a existência de classes sociais (chegando ao cúmulo de afirmar que Chico Mendes era de “elite”, tal como a herdeira do Itaú, Neca Setúbal, que é uma de suas gurus econômicas) e se orienta por um moralismo inconsequente (expresso na obscura ideia de um governo de “pessoas de bem”, “sem partidos”). Enfim, uma lástima, infelizmente, posto que acreditava (ou torcia – vide post anterior) para que, com Marina no segundo turno, o debate político avançasse. Não vai acontecer.

A expectativa que resta, agora, é saber o impacto que este início de desconstrução da novidade Marina poderá ter entre seus eleitores. A candidata que se apresenta como o novo se inclinou fortemente para a direita, com um discurso voltado para o mercado. Isso poderia lhe tirar votos, em particular daquela camada mais à esquerda de jovens que (ainda) enxergam nela a personificação do “espírito de junho”. Por outro lado, pode viabilizá-la como alternativa à direita.

Contudo, é forçoso notar que a audiência do debate é baixa, e a percepção sobre o desempenho e as propostas das candidatas e dos candidatos se dará, como sempre, a partir da narrativa da grande mídia – o que, sabemos bem, desfavorece amplamente a candidatura petista e favorece Marina, que não deverá ter suas contradições, por ora, expostas ao público.

Neste ponto, porém, entra uma última interrogação. Como era de se esperar, os jornalistas da Band que participaram do debate de ontem adotaram uma postura de ataque direto a Dilma e ao PT em todas as oportunidades possíveis. Inclusive, desviando vergonhosamente de seu papel naquele momento (tecer perguntas aos candidatos) e deixando claro seu lado. Mas ontem, da forma como foi costurada, essa posição favoreceu tanto Marina quanto Aécio, que encontraram, ambos, um reforço calculado no ataque ao governo. No entanto, dada a queda do tucano e a consolidação da ex-senadora no segundo lugar – e caso essa tendência se mantenha, o que parece bastante provável – será que a mídia abandonará Aécio e o PSDB e apoiará Marina? 

2 comentários:

  1. Ótimo texto, porém discordo que a Marina tenha falado sem nervosismo. A voz dela tremia...

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    1. Obrigado! Bem, quanto ao nervosismo ou não, é questão de percepção. Acho que mais importante do que a forma da fala, é o conteúdo. Este, sim, é preocupante.

      Abraço

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